Hoje acordei, abri meu computador e fui preparar um cafe preto enquanto ele decidia se ia (ou não) trabalhar. O coitado sofre para iniciar sua jornada diaria, demora, trava, pensa e não age; o outlook – judiação! – carrega minhas mensagens, pela manhã, so com mas noticias. As primeiras elucubrações eletrônicas da minha maquina são sofriveis. Tudo bem, afinal de contas, cada um tem o computador que merece.
Mas hoje, dia 27 de novembro – de calor e provavel temporal no fim da tarde – o problema foi mais grave: meu computador acordou sem o acento agudo! E agora, o que sera de meus comentarios pontuais? Tem mais: assim como a Rita levou os meus 20 anos, o meu coração e – alem de tudo – deixou mudo o violão, o Agudo levou com ele a Crase... E que falta estes dois opostos num so me fazem. Com o Agudo a relação e mais antiga. Cometi muitos deslizes nestes anos de convivio, o deixei de lado, fora de muitas construções gramaticais, mas nada que justificasse sumir assim. Ja a crase e paixão recente. Suas nuances, seu desprezo total por verbos, masculinos, cidades, formas de tratamento... O despertar da faculdade para o seu uso facultativo: nome de mulheres e pronomes possessivos...
Minha manhã passei assim, inconformado por evidências de uma ausência, possivelmente, trameira. Mensagens importantes foram arquivadas e o apetite sumiu. A teclinha preta, com duas gotinhas de tinta branca, invertidas uma em relação a outra, era mais importante para mim do que sempre supus. Revirei todos os papeis, abri gavetas, lambi o carpete sob a escrivaninha. Nada. Meu cafe ficou frio e esteve fraco desde que saiu da cafeteira italiana, fui para a padaria.
Comprei um jornal inteiro pensando so na pagina de Esportes, sentei na varanda para fumar sem muita vergonha e pouco incômodo; chamei o Indio, chamei um expresso. Esqueço a tecla. Pensei em escrever uma mensagem que parabenizasse o trabalho da diretoria do meu time. Lembrei da tecla, virei o cafe, queimei a boca, apaguei o cigarro pela metade e deixei o troco como gorjeta.
Quando voltei, para terminar um texto que comecei teimosamente e havia deixado pela metade, uma pitada de surpresa, alegria honesta e muito espanto: “o Agudo e a Crase voltaram!”. A tecla estava mal ajeitada, ao invés de um ponto sobre o outro – e o outro sob um – estavam de lado agora, mas funcionava! Pensei nas razões: talvez o maltrato de anos com a escrita e a utilização imprecisa destes símbolos tivesse revoltado a dupla; pensei também que ambos, presos numa tecla só, quisessem lembrar de sua importância numa gramática onde os ‘as’ ‘és’ ‘is’ ‘ós’ ‘us’ prevalecem mesmo quando comparados a consoantes – que por sua vez sobressaem, de longe, sobre os acentos e os sinais. Por fim – e foi a explicação que escolhi e tirou (coincidentemente e) completamente qualquer sensação de culpa – acreditei que o casamento entre Agudo e Crase não suportava mais a hierarquia horizontal que, ao contrário da nossa, privilegia quem abaixo está.
Minha rotina manteve-se intacta. A manifestação surtiu efeito, meus acentos hoje são mais valorizados e, em contrapartida, voltei a contar com a colaboração de Agudos e Crases que agora dividem a mesma tecla em posição de igualdade, um ao lado do outro.
*Baseado em fatos reais
28 de novembro de 2006
17 de novembro de 2006
Sem jeito para a timidez
“Eu sou mulher e vou dizer para você: homem interessante é homem tímido!” Ponto. (E) Dancei, maldita hora que eu fui escolher para me vangloriar, há cinco minutos eu me enquadrava perfeitamente no perfil ‘homem interessante’. E olha do que: de uns golzinhos do futebol de várzea, ela não está nem aí para futebol, foi contar uma história que aconteceu com ela num dos jogos da Copa – “Qual foi aquele jogo que deu a maior confusão em São Paulo?” – e eu desembestei a falar do meu futebolzinho; depois parti para as habilidades artísticas, “Escrever música que nem o Milton não é tão complicado assim”. Ai, ai, ai... “Homem... tímido”
E ela deu seus sinais. Olhou para o relógio mais de uma vez, coçou a sobramcelha e – tenha certeza que por educação – segurou uns três bocejos. Eu vi. Não estava, juro, botando panca de galanteador. Olhe que irônico: só estava tentando disfarçar a timidez! “Sou mulher... homem tímido”... Pô, se a idéia fosse impressionar, o sucesso estava garantido. Agora sim, estou totalmente desconfortável. “Maldita timidez, se eu fosse um pouco mais descolado conseguiria explicar que de fui ator, que sou tímido de nascença”. Agora sim eu preciso impressionar, mas como demonstrar o acanhamento? Não adianta demonstrar.
Discretamente anoto num guardanapo “Canção do Sal”, peço “por gentileza” que o garçom leve meu pedido ao músico. O fator sorte ajuda e o músico, não sugere “Coração de Estudante”. A música começa e eu sorrio sem jeito, “Fácil, né, escrever igual O CARA!”... Torço para ela entender a ironia... Anuncio a saideira, “Mais uminha só que amanhã tenho que brincar de bola com os outros meninos”. “Garçom mais uma cerveja e a conta, por favor” ... Será que ela engole essa?
E ela deu seus sinais. Olhou para o relógio mais de uma vez, coçou a sobramcelha e – tenha certeza que por educação – segurou uns três bocejos. Eu vi. Não estava, juro, botando panca de galanteador. Olhe que irônico: só estava tentando disfarçar a timidez! “Sou mulher... homem tímido”... Pô, se a idéia fosse impressionar, o sucesso estava garantido. Agora sim, estou totalmente desconfortável. “Maldita timidez, se eu fosse um pouco mais descolado conseguiria explicar que de fui ator, que sou tímido de nascença”. Agora sim eu preciso impressionar, mas como demonstrar o acanhamento? Não adianta demonstrar.
Discretamente anoto num guardanapo “Canção do Sal”, peço “por gentileza” que o garçom leve meu pedido ao músico. O fator sorte ajuda e o músico, não sugere “Coração de Estudante”. A música começa e eu sorrio sem jeito, “Fácil, né, escrever igual O CARA!”... Torço para ela entender a ironia... Anuncio a saideira, “Mais uminha só que amanhã tenho que brincar de bola com os outros meninos”. “Garçom mais uma cerveja e a conta, por favor” ... Será que ela engole essa?
O DIABO E A MULHER
Texto do meu tio (e mestre de cerimônia na maior parte dos vídeos da minha infância) Luiz. Conhecê-lo e ouvir suas histórias é diversão garantida.
O DIABO E A MULHER
Conta uma pequena história (lenda), que o diabo via frustradas muitas de suas tentativas de fazer o mal, por interferência da mulher.
Toda vez que o homem perdia a paciência ou desanimava, lá estava ela, com sua paz e energia, levantando o equilíbrio dele.
O diabo reuniu-se com seus assessores e depois de muito discutir chegou a seguinte conclusão :- "a mulher deveria descer ao mesmo nível do homem". Ela que sempre foi elevada, e neste aspecto era respeitada até pelos demônios, teria que mudar de papel, e baixar suas vibrações para cair ao ponto do orgulhoso homem que, ilusoriamente, se julgava superior.
Mas como fazer isso ? A tarefa não era fácil, pois a vaidade feminina se resumia apenas no embelezamento físico e não na idéia de comando.
Contratou um perito das sombras, em tarefas relacionadas com o orgulho e a vaidade humana, e este, que das trevas era um especialista, criou o movimento feminista.
O DIABO E A MULHER
Conta uma pequena história (lenda), que o diabo via frustradas muitas de suas tentativas de fazer o mal, por interferência da mulher.
Toda vez que o homem perdia a paciência ou desanimava, lá estava ela, com sua paz e energia, levantando o equilíbrio dele.
O diabo reuniu-se com seus assessores e depois de muito discutir chegou a seguinte conclusão :- "a mulher deveria descer ao mesmo nível do homem". Ela que sempre foi elevada, e neste aspecto era respeitada até pelos demônios, teria que mudar de papel, e baixar suas vibrações para cair ao ponto do orgulhoso homem que, ilusoriamente, se julgava superior.
Mas como fazer isso ? A tarefa não era fácil, pois a vaidade feminina se resumia apenas no embelezamento físico e não na idéia de comando.
Contratou um perito das sombras, em tarefas relacionadas com o orgulho e a vaidade humana, e este, que das trevas era um especialista, criou o movimento feminista.
27 de outubro de 2006
Veja e (é) Geraldo para presidente
Pô, eu não ia entrar em questões políticas, mas esta eu não resisti. Curtinha e mata dois coelhos numa machadada só...
Estão falando por aí que, por causa da revista VEJA, vão mudar o nome do Geraldo Alckmin. Agora vão escrever com “J” para facilitar.
Vai ficar assim: Vote Em Jeraldo Alckmim.
Estão falando por aí que, por causa da revista VEJA, vão mudar o nome do Geraldo Alckmin. Agora vão escrever com “J” para facilitar.
Vai ficar assim: Vote Em Jeraldo Alckmim.
Instruções para comer um pastel de pizza na feira
Em homenagem a Júlio Cortázar, escritor argentino – embora tenha nascido em Bruxelas, Bélgica [CLIQUE AQUI e visite seu sítio oficial. É argentino, está em espanhol, beleza?] – que em seu livro História de cronópios e famas oferece ao leitor instruções para chorar, matar formigas em Roma, dar corda no relógio. Sem esquecer das, para mim, utilíssimas “Instruções para entender três pinturas famosas”.
Não, não. Na verdade vou fazer justiça aqui. Quero homenagear minha irmã e mãe coruja do Louis – meu sobrinho chique –, Carmen [VISITE AQUI o sítio dela]. Se eu tenho um pé (leia curiosidade) no mundo das artes, certamente foi influência dela. Por suas análises, comentários e tudo que ela sempre me apresentou este texto vai pra ela. Inclusive, o livro que inspira o texto que segue, foi ela que me deu com uma de suas dedicatórias maravilhosas. Ah, além de tudo, é a maior divulgadora deste Blog (rs)...
Não está à altura da (os) homenageada (os), assim mesmo, segue o texto:
Instruções para comer um pastel de pizza na feira
Na feira você deve passear. Se quiser realmente apreciar o passeio pela feira, tem que ser pela manhã; de chinelo, bermuda ou ex-calça jeans com as pernas cortadas, camisa bonita há alguns anos, um ar sereno e o olhar desconfiado para as frutas e os legumes. Depois de andar e comprar apenas meia-dúzia de limões é obrigação fazer valer a ronda e dar uma força para o estômago que, em casa, vai ter que esperar até às três da tarde para o almoço sair.
Aí, da segunda fileira de pessoas que cercam o trailer do pasteleiro, o japonês, suando, grita: “Bomdia!Qualosabor?” Nunca peça sem ter certeza. Se você disser um “queeeeero” mais comprido o ajudante – que é os ouvidos, braços, ânimo e pressa do dono do quiosque – já jogou um pastel de queijo no óleo! Não há tempo para se perder e adivinhação não é o forte em pastelarias.
Você chega decidido e, sem pestanejar, solta um sonoro “O meu é pizza”. Além dos cuidados normais que sua mãe ensina na infância e repete pelo resto da vida, “Corta uma pontinha antes”, “Tem que tomar cuidado com o vapor, uma moça já ficou cega por isso” – aqui vale uma nota: como alguém que escuta isto pode comer um pastel tranquilamente –, “Cuidado que vai pingar na calça”, “Cuidado que vai pingar no tênis”, “Cuidado que vai pingar na blusa”, “Cuidado que vai (e vai mesmo, acredite) pingar!”, existem outros cuidados.
O pastel de pizza tradicional, deixando os regionalismos – ou melhor, considerando minha região como a tradicional (o que está longe de ser verdade) –, é feito de massa, muito óleo, pouco queijo, uma pitadinha de orégano e TOMATE!
O pastel fica dividido em três níveis de calor: o óleo e a massa não têm erro, dois sopros, a temperatura fica a ideal, e assunto encerrado; o queijo é aquele negócio. Escorre, é quente, não parte direito, você tem que inclinar para frente, empurrar o pastel, segura o filetinho de queijo, tenta parti-lo, gruda no guardanapo – se não fosse o aspecto pouco higiênico de todo contexto, você lamberia o papel... é uma briguinha, que no fim das contas chega a ser bacana; sobre o orégano, por questões óbvias, eu não vou falar nada; o problema todo está no tomate. Ele parece reter mais calor que todos os outros ingredientes juntos, dizem que é pela quantidade de água, sei lá. O devorador desavisado, afoito pela fome, atropela-se mordida atrás de mordida, quando chega à fruta – que por muito tempo a civilização achou que era venenosa – é traído pela quentura e quando tenta se desvencilhar a pele – ainda pressa em uma das extremidades da rodela vermelha – traz todo o recheio fervente ao seu queixo. – O amigo da minha prima de segundo grau teve sua cara deformada assim... sério!
Para se comer um pastel de pizza na feira, em primeiro lugar, você deve saber até que ponto consegue controlar seu ímpeto comedor. Se for jogar boca a dentro o pastel todo em uma tacada só, a melhor coisa que você faz é pedir um de carne, frango com requeijão ou até mesmo o simples de queijo. Mas se o pizza é o seu predileto mesmo, aproveite os minutos em que estará dedicado à empreitada para saborear os molhos que a esposa do japonês preparou: uma mordida e um pouquinho de molho de alho; outra e um pouco da pimenta – é de bom alvitre começar sempre pela pimenta mais fraca, tem uns japas sarcásticos por aí –; quando chegar o tomate, que sempre fica do meio para o fim, por que não experimentá-lo com um vinagrete fresquinha? Dê uma sopradinha antes, morda com a convicção de que pele será totalmente partida por seus dentes afiados e boas!
Não, não. Na verdade vou fazer justiça aqui. Quero homenagear minha irmã e mãe coruja do Louis – meu sobrinho chique –, Carmen [VISITE AQUI o sítio dela]. Se eu tenho um pé (leia curiosidade) no mundo das artes, certamente foi influência dela. Por suas análises, comentários e tudo que ela sempre me apresentou este texto vai pra ela. Inclusive, o livro que inspira o texto que segue, foi ela que me deu com uma de suas dedicatórias maravilhosas. Ah, além de tudo, é a maior divulgadora deste Blog (rs)...
Não está à altura da (os) homenageada (os), assim mesmo, segue o texto:
Instruções para comer um pastel de pizza na feira
Na feira você deve passear. Se quiser realmente apreciar o passeio pela feira, tem que ser pela manhã; de chinelo, bermuda ou ex-calça jeans com as pernas cortadas, camisa bonita há alguns anos, um ar sereno e o olhar desconfiado para as frutas e os legumes. Depois de andar e comprar apenas meia-dúzia de limões é obrigação fazer valer a ronda e dar uma força para o estômago que, em casa, vai ter que esperar até às três da tarde para o almoço sair.
Aí, da segunda fileira de pessoas que cercam o trailer do pasteleiro, o japonês, suando, grita: “Bomdia!Qualosabor?” Nunca peça sem ter certeza. Se você disser um “queeeeero” mais comprido o ajudante – que é os ouvidos, braços, ânimo e pressa do dono do quiosque – já jogou um pastel de queijo no óleo! Não há tempo para se perder e adivinhação não é o forte em pastelarias.
Você chega decidido e, sem pestanejar, solta um sonoro “O meu é pizza”. Além dos cuidados normais que sua mãe ensina na infância e repete pelo resto da vida, “Corta uma pontinha antes”, “Tem que tomar cuidado com o vapor, uma moça já ficou cega por isso” – aqui vale uma nota: como alguém que escuta isto pode comer um pastel tranquilamente –, “Cuidado que vai pingar na calça”, “Cuidado que vai pingar no tênis”, “Cuidado que vai pingar na blusa”, “Cuidado que vai (e vai mesmo, acredite) pingar!”, existem outros cuidados.
O pastel de pizza tradicional, deixando os regionalismos – ou melhor, considerando minha região como a tradicional (o que está longe de ser verdade) –, é feito de massa, muito óleo, pouco queijo, uma pitadinha de orégano e TOMATE!
O pastel fica dividido em três níveis de calor: o óleo e a massa não têm erro, dois sopros, a temperatura fica a ideal, e assunto encerrado; o queijo é aquele negócio. Escorre, é quente, não parte direito, você tem que inclinar para frente, empurrar o pastel, segura o filetinho de queijo, tenta parti-lo, gruda no guardanapo – se não fosse o aspecto pouco higiênico de todo contexto, você lamberia o papel... é uma briguinha, que no fim das contas chega a ser bacana; sobre o orégano, por questões óbvias, eu não vou falar nada; o problema todo está no tomate. Ele parece reter mais calor que todos os outros ingredientes juntos, dizem que é pela quantidade de água, sei lá. O devorador desavisado, afoito pela fome, atropela-se mordida atrás de mordida, quando chega à fruta – que por muito tempo a civilização achou que era venenosa – é traído pela quentura e quando tenta se desvencilhar a pele – ainda pressa em uma das extremidades da rodela vermelha – traz todo o recheio fervente ao seu queixo. – O amigo da minha prima de segundo grau teve sua cara deformada assim... sério!
Para se comer um pastel de pizza na feira, em primeiro lugar, você deve saber até que ponto consegue controlar seu ímpeto comedor. Se for jogar boca a dentro o pastel todo em uma tacada só, a melhor coisa que você faz é pedir um de carne, frango com requeijão ou até mesmo o simples de queijo. Mas se o pizza é o seu predileto mesmo, aproveite os minutos em que estará dedicado à empreitada para saborear os molhos que a esposa do japonês preparou: uma mordida e um pouquinho de molho de alho; outra e um pouco da pimenta – é de bom alvitre começar sempre pela pimenta mais fraca, tem uns japas sarcásticos por aí –; quando chegar o tomate, que sempre fica do meio para o fim, por que não experimentá-lo com um vinagrete fresquinha? Dê uma sopradinha antes, morda com a convicção de que pele será totalmente partida por seus dentes afiados e boas!
19 de outubro de 2006
Brasil de Fato
Segue uma sugestão a amigos e visitantes em geral. O texto que descreve o Jornal Brasil de Fato copiei na íntegra no sítio deles. [CLIQUE AQUI e vá à página]
Tornei-me assinante – neste momento, ainda não peguei nenhuma edição para para emitir opinião – e recomento, a princípio, por absoluta simpatia.
É isso aí.
O Jornal Brasil de Fato foi lançado no Fórum Social Mundial de Porto Alegre, em 25 de janeiro de 2003. Com tiragem de 50 mil exemplares (16 páginas coloridas, tamanho standard), o Brasil de Fato é um jornal semanal, com circulação nacional.
Por entender que, na luta por uma sociedade justa e fraterna, a democratização dos meios de comunicação é fundamental, movimentos sociais como o MST, a Via Campesina, a Consulta Popular e as pastorais sociais criaram o jornal Brasil de Fato — um semanal político, de circulação nacional, para contribuir no debate de idéias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais em nosso país.
Plural e diversificado, o Brasil de Fato reúne jornalistas, articulistas e intelectuais do Brasil e do Mundo, personalidades renomadas como: Ariovaldo Umbelino, Emir Sader, Plinio Arruda Sampaio, Sebastião Salgado, Dom Mauro Morelli, Dom Demétrio Valentini, Dom Tomás Balduíno, João Pedro Stedile, Zé Geraldo, Chico César, Letícia Sabatella, Augusto Boal entre outros.
Tornei-me assinante – neste momento, ainda não peguei nenhuma edição para para emitir opinião – e recomento, a princípio, por absoluta simpatia.
É isso aí.
O Jornal Brasil de Fato foi lançado no Fórum Social Mundial de Porto Alegre, em 25 de janeiro de 2003. Com tiragem de 50 mil exemplares (16 páginas coloridas, tamanho standard), o Brasil de Fato é um jornal semanal, com circulação nacional.
Por entender que, na luta por uma sociedade justa e fraterna, a democratização dos meios de comunicação é fundamental, movimentos sociais como o MST, a Via Campesina, a Consulta Popular e as pastorais sociais criaram o jornal Brasil de Fato — um semanal político, de circulação nacional, para contribuir no debate de idéias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais em nosso país.
Plural e diversificado, o Brasil de Fato reúne jornalistas, articulistas e intelectuais do Brasil e do Mundo, personalidades renomadas como: Ariovaldo Umbelino, Emir Sader, Plinio Arruda Sampaio, Sebastião Salgado, Dom Mauro Morelli, Dom Demétrio Valentini, Dom Tomás Balduíno, João Pedro Stedile, Zé Geraldo, Chico César, Letícia Sabatella, Augusto Boal entre outros.
Ônibus
Voltei aos pontos de ônibus. Já tinha esquecido como era triste esta vida! Anda, anda (...), anda; vê e não vê gente, esbarra, toma garoa, escapamento dos outros ônibus. Tudo cinza daltônico. Chacoalha, sacode, dorme, cai o livro, toca o telefone: estou atrasado.
“Neste momento deve estar saindo do terminal o trólebus que eu deveria pegar se estivesse no horário, se tivesse levantado quando abri o olho pela primeira vez. E eu estou aqui, a meia-hora de lá”.
Estou há meia-hora dela também. Enquanto me arrumava resmungou alguma coisa, virou e dormiu. Ah se eu pudesse, arrancava a alma de dentro dela e colocava a minha ali.
Volta o sono e o olho não agüenta. Barulho de freio, acordo. O chuvisco está lá fora e aqui dentro também, “a moça perfumada da frente sente calor?” Com cabelo bem enrolado e curto, com o pescoço a 38 centímetros do meu nariz, posso vê-la arrepiada. “Por que esta janela está aberta? Não me incomoda, no fundo até me agrada tomar um pouco desta chuva. Por algum motivo tira a sensação de estar respirando ar reciclado. Esqueço que o ar – que sai da boca do cidadão sentado ao meu lado – entra em mim, passa pelos pêlos do meu nariz, pulmão, sangue...credo”.
“Relutei por uma hora para não vir para este lugar e agora não queria ter que descer”. Puxa a cordinha, escorrega, caí o papel da seguradora do carro roubado que agora marca meu livro. “O bafo é ruim, mas o coração é generoso”: o mesmo gordinho que me espremia pega o papel que molhou no chão de aço da condução. Freia, escorrego, quase caio, seguro no corrimão – se é que posso chamar aquela barra de ferro de corrimão – degrau, degrau, mais um degrau e pulo pra rua.
“Esqueci de olhar se vinha a moto.” Uma kombi espera o ônibus voltar a andar. “Será que consigo atravessar enquanto isso.” Asfalto, duas faixas amarelas, mais asfalto. Carros dos dois lados e eu parado sobre as faixas. A garoa vem de lado e os cílios não dão conta, as gotas chegam à retina.
Pronto, estou do outro lado, agora é encarar esta ladeira e as pessoas que se atropelam com determinação. A mão está molhada, o peito – assim como toda a parte da frente – está ensopado, o náilon do tênis já desistiu de segurar a água e a lombada do livro deixa de ser nova.
Ando, ando e ando. Descuido e pego o bilhete magnético do trólebus com a mão molhada – tinha que secar nas costas antes – e invisto na catraca: Pééééééé!
– Deve ter molhado. Vá a bilheteria e troque. “De vida.”
“Neste momento deve estar saindo do terminal o trólebus que eu deveria pegar se estivesse no horário, se tivesse levantado quando abri o olho pela primeira vez. E eu estou aqui, a meia-hora de lá”.
Estou há meia-hora dela também. Enquanto me arrumava resmungou alguma coisa, virou e dormiu. Ah se eu pudesse, arrancava a alma de dentro dela e colocava a minha ali.
Volta o sono e o olho não agüenta. Barulho de freio, acordo. O chuvisco está lá fora e aqui dentro também, “a moça perfumada da frente sente calor?” Com cabelo bem enrolado e curto, com o pescoço a 38 centímetros do meu nariz, posso vê-la arrepiada. “Por que esta janela está aberta? Não me incomoda, no fundo até me agrada tomar um pouco desta chuva. Por algum motivo tira a sensação de estar respirando ar reciclado. Esqueço que o ar – que sai da boca do cidadão sentado ao meu lado – entra em mim, passa pelos pêlos do meu nariz, pulmão, sangue...credo”.
“Relutei por uma hora para não vir para este lugar e agora não queria ter que descer”. Puxa a cordinha, escorrega, caí o papel da seguradora do carro roubado que agora marca meu livro. “O bafo é ruim, mas o coração é generoso”: o mesmo gordinho que me espremia pega o papel que molhou no chão de aço da condução. Freia, escorrego, quase caio, seguro no corrimão – se é que posso chamar aquela barra de ferro de corrimão – degrau, degrau, mais um degrau e pulo pra rua.
“Esqueci de olhar se vinha a moto.” Uma kombi espera o ônibus voltar a andar. “Será que consigo atravessar enquanto isso.” Asfalto, duas faixas amarelas, mais asfalto. Carros dos dois lados e eu parado sobre as faixas. A garoa vem de lado e os cílios não dão conta, as gotas chegam à retina.
Pronto, estou do outro lado, agora é encarar esta ladeira e as pessoas que se atropelam com determinação. A mão está molhada, o peito – assim como toda a parte da frente – está ensopado, o náilon do tênis já desistiu de segurar a água e a lombada do livro deixa de ser nova.
Ando, ando e ando. Descuido e pego o bilhete magnético do trólebus com a mão molhada – tinha que secar nas costas antes – e invisto na catraca: Pééééééé!
– Deve ter molhado. Vá a bilheteria e troque. “De vida.”
10 de outubro de 2006
É música, poema e um pouco da gente
Hoje, a caminho do trabalho, estava ouvindo Fado Tropical (sempre Chico, né? ...previsível...) e achei interessante falar da música assinada por Chico Buarque e Ruy Guerra neste espaço.
Censurada durante a ditadura militar e criada pouco antes de Chico Buarque ser exilado, Fado Tropical descreve a tristeza de um brasileiro que se vê obrigado a deixar o país.
“Oh, musa do meu fado
Mas, além de servir como retrato da situação política que mal-tratou nosso (para resumir bem!!!) país por 21 anos, o diretor e roteirista de cinema, compositor (...) moçambicano, Ruy Guerra, recita um poema (brilhante), que humaniza um carrasco e expõe suas crises. A consciência de uma personagem que não esperamos que tenha consciência. A partir deste ponto esta música torna-se eterna, atemporal.
“Sabe, no fundo eu sou um sentimental
E continua, após algumas estrofes apresentadas por Chico, seu depoimento:
Censurada durante a ditadura militar e criada pouco antes de Chico Buarque ser exilado, Fado Tropical descreve a tristeza de um brasileiro que se vê obrigado a deixar o país.
“Oh, musa do meu fado
Oh, minha mãe gentil
Te deixo consternado
No primeiro abril
Mas não sê tão ingrata
Não esquece quem te amou
E em tua densa mata
Se perdeu e se encontrou
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal”. (...)
Mas, além de servir como retrato da situação política que mal-tratou nosso (para resumir bem!!!) país por 21 anos, o diretor e roteirista de cinema, compositor (...) moçambicano, Ruy Guerra, recita um poema (brilhante), que humaniza um carrasco e expõe suas crises. A consciência de uma personagem que não esperamos que tenha consciência. A partir deste ponto esta música torna-se eterna, atemporal.
“Sabe, no fundo eu sou um sentimental
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dose de lirismo...(além dasífilis, é claro)
Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar
Meu coração fecha os olhos e sinceramente chora..."
E continua, após algumas estrofes apresentadas por Chico, seu depoimento:
"Meu coração tem um sereno jeito
E as minhas mãos o golpe duro e presto
De tal maneira que, depois de feito
Desencontrado, eu mesmo me contesto
Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intenção e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito
Me assombra a súbita impressão de incesto
Quando me encontro no calor da luta
Ostento a aguda empunhadora à proa
Mas o meu peito se desabotoa
E se a sentença se anuncia bruta
Mais que depressa a mão cega executa
Pois que senão o coração perdoa..."
Podemos pensar neste poema como uma confissão e enxergar a angústia de quem faz o mal. Ver um caráter emotivo e piedoso em quem exerce o ofício de não pestanejar, que jamais perdoa, mas que depois de feito, desencontrado, ele mesmo se contesta.
Este carrasco não tem muito de nós? (Corro o risco aqui de começar a discutir o óbvio achando que ‘encontrei ouro’) Sem entrar no mérito da natureza humana, se somos bons ou maus. Falo de nossas opções, prioridades, do que abrimos mão sem darmos conta. E aí, podemos falar do que quisermos, serve para todos.
Será que não trazemos “as mãos distantes do peito”? E, “no calor da luta”, nossas parábolas, nossa independência proclamada aos quatro cantos ou apenas para si mesmo não são mentiras? Espero que não (embora não acredite nisso). Tenho certeza que, ao baixar do cutelo, se perceber que durante toda a vida alguma alienação, ou motivação secundária, fez com que eu não fizesse nada, tenho certeza, o coração não há de perdoar!
9 de outubro de 2006
Texto de Luis Gustavo Imperatore
Luis Gustavo Imperatore, consultor do Grupo Cherto, gentilmente permitiu que eu postasse seu relato sobre sua experiência em uma favela no Rio de Janeiro.
Compartilho com vocês uma visão da experiência que tive numa favela do Rio de Janeiro.
No projeto da Fundação Roberto Marinho, em que estamos desenhando o modelo de expansão de "Telessalas" (salas de aula de ensino fundamental e médio que usam a metodologia de ensino do Telecurso 2000, o mesmo que passa na Rede Globo), fui conhecer uma dessas Telessalas numa comunidade do Complexo da Maré, conjunto de 19 favelas na zona norte do Rio. Estas Telessalas na Maré são operadas pela ONG Viva Rio, parceira da Fundação Roberto Marinho.
No Complexo há escolas públicas, mas como não conseguem atender a toda demanda destas comunidades, há espaço para a atuação de projetos sócio-educacionais do Terceiro Setor.
Estas comunidades são dominadas pelo tráfico de drogas, violência gritante e explícita no dia a dia e na porta de casa, baixo nível educacional e profissional e conseqüente baixa estima generalizada de seus moradores. Vivem sob um código de conduta social próprio e imposto pelos chefes do tráfico, que isola a comunidade e cria territórios segregados da sociedade civil organizada e do Estado de Direito. A presença do Estado só se faz sentir pelos serviços públicos de água-luz-telefone, ruas asfaltadas, escolas públicas em condições precárias e da polícia que visita com freqüência o território "proibido" em veículos militares blindados em operações de repressão.
Chegamos ao Complexo com uma informação que só piorou a expectativa formada anteriormente: a favela Nova Holanda, que iríamos visitar, é uma das mais violentas. Porém, tínhamos o consolo de que o pessoal do Viva Rio é respeitado e protegido lá dentro. Entramos na comunidade à noite, com um motorista do Viva Rio, já conhecido pelos vigias do tráfico. Para evitar uma recepção agressiva, algumas regras que podem ser vitais: vidros abertos, luz interna acesa, velocidade baixa, nenhuma manobra agressiva, e o percurso que passe por menos "bocas" do tráfico.
No caminho até o prédio do Viva Rio, verdadeiro contraste de excelência em meio à selvageria do estado de permanente guerra civil, algumas visões surpreendentes da forma como a vida e a economia se organizam sob estas condições. Ruas estreitas tomadas por lojas bem montadas, pequenos supermercados e muita gente por todo lado, mesmo à noite. Nenhum sinal de que estejam mal ou desabastecidos. Aparentemente ninguém "de fora" freqüenta o local, a não ser os que consomem os produtos distribuídos nas "bocas". Mas o comércio é fervilhante, parecido com as áreas comerciais de Ciudad del Este, no Paraguay.
Em nosso trajeto, passamos por vários vigias com armamento pesado, no meio da rua, a poucos metros da Av. Brasil e de um quartel da Polícia Militar, fortificação situada nos limites do Complexo. A tensão de estar ali é resultado de um misto da perplexidade do que se vê, insegurança por nos sentirmos intrusos em território alheio e da iminência de atentados que podem acontecer e acontecem rotineiramente. Naquele dia tinha havido pelo menos dois assassinatos na comunidade. Enquanto estávamos na visita às Telessalas, ouvíamos explosões de fogos de artifício, avisos dos "fogueteiros" de que o "caveirão", veículo blindado da polícia, estava entrando no Complexo.
Na mesma noite em que havia um Flamengo e Vasco no "Maraca", salas de aula cheias de moradores da comunidade, faixa etária variando de 15 a mais de 50, sedentos por educação, aprendendo a entender seu papel na sociedade, e tendo, talvez pela primeira vez na vida, o sonho e a perspectiva de melhorar de vida. Os que já conseguiram não querem sair de lá. Sentem-se responsáveis por mudar o meio em que nasceram e vivem, e se comprometem a dar melhores oportunidades às próximas gerações.
Antes de ir embora, uma professora da Telessala pede para esperarmos, vai consultar uma fonte de informação e volta com a "liberação" e o roteiro a seguirmos até a Av. Brasil.
Pouco menos de uma hora dentro da Maré e surge uma série de questionamentos que põem em cheque nosso modelo social, muitos dos quais vão se evidenciar somente com o tempo. Além do alívio de sair do "território inimigo", ficam lições imediatas:
(1) na ausência do Estado surge um poder paralelo que pode ser mais organizado e mais eficiente que muitos governos oficiais
(2) as pessoas são o resultado da formação que a sociedade lhes dá
(3) mesmo em ambiente adverso existe um mercado interessante e canais de venda se estruturam e vivem bem
Mais do que qualquer coisa, a visão é de que somente reclamar e se distanciar de tudo isso não resolve absolutamente nada. Modelos que dêem educação, perspectiva e um sentido à vida das pessoas parecem ser o melhor caminho para soluções sustentáveis.
Compartilho com vocês uma visão da experiência que tive numa favela do Rio de Janeiro.
No projeto da Fundação Roberto Marinho, em que estamos desenhando o modelo de expansão de "Telessalas" (salas de aula de ensino fundamental e médio que usam a metodologia de ensino do Telecurso 2000, o mesmo que passa na Rede Globo), fui conhecer uma dessas Telessalas numa comunidade do Complexo da Maré, conjunto de 19 favelas na zona norte do Rio. Estas Telessalas na Maré são operadas pela ONG Viva Rio, parceira da Fundação Roberto Marinho.
No Complexo há escolas públicas, mas como não conseguem atender a toda demanda destas comunidades, há espaço para a atuação de projetos sócio-educacionais do Terceiro Setor.
Estas comunidades são dominadas pelo tráfico de drogas, violência gritante e explícita no dia a dia e na porta de casa, baixo nível educacional e profissional e conseqüente baixa estima generalizada de seus moradores. Vivem sob um código de conduta social próprio e imposto pelos chefes do tráfico, que isola a comunidade e cria territórios segregados da sociedade civil organizada e do Estado de Direito. A presença do Estado só se faz sentir pelos serviços públicos de água-luz-telefone, ruas asfaltadas, escolas públicas em condições precárias e da polícia que visita com freqüência o território "proibido" em veículos militares blindados em operações de repressão.
Chegamos ao Complexo com uma informação que só piorou a expectativa formada anteriormente: a favela Nova Holanda, que iríamos visitar, é uma das mais violentas. Porém, tínhamos o consolo de que o pessoal do Viva Rio é respeitado e protegido lá dentro. Entramos na comunidade à noite, com um motorista do Viva Rio, já conhecido pelos vigias do tráfico. Para evitar uma recepção agressiva, algumas regras que podem ser vitais: vidros abertos, luz interna acesa, velocidade baixa, nenhuma manobra agressiva, e o percurso que passe por menos "bocas" do tráfico.
No caminho até o prédio do Viva Rio, verdadeiro contraste de excelência em meio à selvageria do estado de permanente guerra civil, algumas visões surpreendentes da forma como a vida e a economia se organizam sob estas condições. Ruas estreitas tomadas por lojas bem montadas, pequenos supermercados e muita gente por todo lado, mesmo à noite. Nenhum sinal de que estejam mal ou desabastecidos. Aparentemente ninguém "de fora" freqüenta o local, a não ser os que consomem os produtos distribuídos nas "bocas". Mas o comércio é fervilhante, parecido com as áreas comerciais de Ciudad del Este, no Paraguay.
Em nosso trajeto, passamos por vários vigias com armamento pesado, no meio da rua, a poucos metros da Av. Brasil e de um quartel da Polícia Militar, fortificação situada nos limites do Complexo. A tensão de estar ali é resultado de um misto da perplexidade do que se vê, insegurança por nos sentirmos intrusos em território alheio e da iminência de atentados que podem acontecer e acontecem rotineiramente. Naquele dia tinha havido pelo menos dois assassinatos na comunidade. Enquanto estávamos na visita às Telessalas, ouvíamos explosões de fogos de artifício, avisos dos "fogueteiros" de que o "caveirão", veículo blindado da polícia, estava entrando no Complexo.
Na mesma noite em que havia um Flamengo e Vasco no "Maraca", salas de aula cheias de moradores da comunidade, faixa etária variando de 15 a mais de 50, sedentos por educação, aprendendo a entender seu papel na sociedade, e tendo, talvez pela primeira vez na vida, o sonho e a perspectiva de melhorar de vida. Os que já conseguiram não querem sair de lá. Sentem-se responsáveis por mudar o meio em que nasceram e vivem, e se comprometem a dar melhores oportunidades às próximas gerações.
Antes de ir embora, uma professora da Telessala pede para esperarmos, vai consultar uma fonte de informação e volta com a "liberação" e o roteiro a seguirmos até a Av. Brasil.
Pouco menos de uma hora dentro da Maré e surge uma série de questionamentos que põem em cheque nosso modelo social, muitos dos quais vão se evidenciar somente com o tempo. Além do alívio de sair do "território inimigo", ficam lições imediatas:
(1) na ausência do Estado surge um poder paralelo que pode ser mais organizado e mais eficiente que muitos governos oficiais
(2) as pessoas são o resultado da formação que a sociedade lhes dá
(3) mesmo em ambiente adverso existe um mercado interessante e canais de venda se estruturam e vivem bem
Mais do que qualquer coisa, a visão é de que somente reclamar e se distanciar de tudo isso não resolve absolutamente nada. Modelos que dêem educação, perspectiva e um sentido à vida das pessoas parecem ser o melhor caminho para soluções sustentáveis.
Luis Gustavo Imperatore
6 de outubro de 2006
O Egoísmo Narcisista de um Herói à Espreita
Desde pequeno acreditei que algo extraordinário iria acontecer comigo. Assim, com seres evoluídos de outra galáxia, num disco voador, que depois de acompanharem meu nascimento, infância, e me saberem especial, viriam me abduzir. Seres com um grau de evolução impensável para um humano se curvariam a minha capacidade intelectual e física e, com técnicas estratosféricas, literalmente, tirariam todos os obstáculos da minha mente e me tornariam único.Talvez fosse herói num seqüestro. O seqüestro da mais bonita seria resolvido após batalhas de dar inveja. Inteligência e destreza, atitude arrojadas e tranqüilidade de monge. Contaria com a ajuda de amigos (coadjuvantes, é claro!) que ao fim difundiriam pelo resto de suas vidas a incrível história do amigo que inacreditável que tiveram.Ah, não pode faltar esta: o gol no último minuto, na final! Sem querer, pode ser, mas comprovadamente um gol de quem tem estrela, de quem a bola procura esbarrar antes de entrar no retângulo horizontal. Estaria eu defendendo o time dos amigos sofridos da vila, que me idolatraram na história anterior, e salvaria o suor de um campeonato inteiro sob o olhar atento da mais bonita que me deve a vida salva na noite anterior. Daria o prazer de existir, entende? Até E.T. telepático me amaria. Você já deve estar desconfiado de que nada disso aconteceu. Até o início deste ensaio, nada aconteceu que me tornasse especial ou herói. Não conto com a sorte de ficar enganchado pela capa quando estava para cair do precipício, mas com a dos normais (se você, amigo, não tem super-poderes entenderá bem o significado disto): tenho mulher que me satisfaz mais que eu a ela. Que me sabe não especial, não me admira em nada, mas criada pela monotonia me dá o prazer de não querer saber para onde vou ou vim.A bola esbarra, de vez em quando, e entra. Certo que meu time não é chegado a decisões, finais de campeonato. Nunca sob o olhar da mais bela a aplaudir com o olhar admirado como quem vê um gladiador voltar vivo da arena com leões. Mas considero-os com o mesmo carinho de pai a filho incompetente. Numa oportunidade vi luzes no céu, pensei estarem chegando, e o coração bateu um pouco mais forte. Luminosos de um fábrica, a mesma que escurece o azul do dia, iluminava o breu. Não chamavam por Batman ou coisa parecida, divertiam-se apenas e eu caí, não eram meus companheiros intergalácticos. Não aconteceu. Caminho com a obstinação dos teimosos, a crença dos fracos, o ‘impávido colosso’ dos obesos; vivo confortável no sofá ocioso dos preguiçosos. Mas sou generoso comigo. Construo com estas e outras características meu ‘eu herói’, o herói que está à espreita dos acontecimentos. Que espera a violência à burguesa para salvá-la e recortar a notícia do jornal da manhã seguinte. Ainda tenho trunfos de herói genuíno: obstinação dos certos, crença dos mais que humanos, ‘impávido colosso’ dos mais fortes que armas; tudo coberto pelo ócio de sabedoria milenar, fonte da frieza e calma onde todos se desesperam. Posso dizer que sou um herói à espera da oportunidade. Talvez um deus qualquer, um com espírito de mãe, me proteja, me coloque longe das grandes tragédias para não correr perigo por meu ímpeto ousado. Talvez me prive de sucessos menores para apresentar-me ao mundo no Grand Finale, com status de herói novo carregando a esperança sobre os ombros.Convivo com pequenos milagres caseiros que não impressionam, mas dizem muito. A observação dos anos de sofá não me deixa perder a volta do programa televisivo após o intervalo de nenhum canal; posso prever o exato momento que o relógio digital do vídeo vai mudar o minuto; do banco do carro, como passageiro, não sei guiar, pressinto a hora exata que a luz verde vai acender. Curto cada um destes sinais de heroísmo existente. Difícil, confidente, é entender porque ninguém nunca notou isso.
Gustavo Novo
Gustavo Novo
Seja bem-vindo!
Olá, amigo internauta!
Decidi criar este blog sem muita coisa em mente. Talvez para criar (mais) uma rotina na minha vida, ter uma espécie de diário público. (Duvido muito que hajam atualizações diárias, se conseguir semanalmente já será uma vitória.)
Bom, é isso aí, conforme as idéias surjam, publico meus textos, pensamentos, piadas, dilemas... O espaço é democrático e a participação de todos é muito bem-vinda!
Grande abraço.
Decidi criar este blog sem muita coisa em mente. Talvez para criar (mais) uma rotina na minha vida, ter uma espécie de diário público. (Duvido muito que hajam atualizações diárias, se conseguir semanalmente já será uma vitória.)
Bom, é isso aí, conforme as idéias surjam, publico meus textos, pensamentos, piadas, dilemas... O espaço é democrático e a participação de todos é muito bem-vinda!
Grande abraço.
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