27 de outubro de 2006

Instruções para comer um pastel de pizza na feira

Em homenagem a Júlio Cortázar, escritor argentino – embora tenha nascido em Bruxelas, Bélgica [CLIQUE AQUI e visite seu sítio oficial. É argentino, está em espanhol, beleza?] – que em seu livro História de cronópios e famas oferece ao leitor instruções para chorar, matar formigas em Roma, dar corda no relógio. Sem esquecer das, para mim, utilíssimas “Instruções para entender três pinturas famosas”.

Não, não. Na verdade vou fazer justiça aqui. Quero homenagear minha irmã e mãe coruja do Louis – meu sobrinho chique –, Carmen [VISITE AQUI o sítio dela]. Se eu tenho um pé (leia curiosidade) no mundo das artes, certamente foi influência dela. Por suas análises, comentários e tudo que ela sempre me apresentou este texto vai pra ela. Inclusive, o livro que inspira o texto que segue, foi ela que me deu com uma de suas dedicatórias maravilhosas. Ah, além de tudo, é a maior divulgadora deste Blog (rs)...
Não está à altura da (os) homenageada (os), assim mesmo, segue o texto:

Instruções para comer um pastel de pizza na feira

Na feira você deve passear. Se quiser realmente apreciar o passeio pela feira, tem que ser pela manhã; de chinelo, bermuda ou ex-calça jeans com as pernas cortadas, camisa bonita há alguns anos, um ar sereno e o olhar desconfiado para as frutas e os legumes. Depois de andar e comprar apenas meia-dúzia de limões é obrigação fazer valer a ronda e dar uma força para o estômago que, em casa, vai ter que esperar até às três da tarde para o almoço sair.
Aí, da segunda fileira de pessoas que cercam o trailer do pasteleiro, o japonês, suando, grita: “Bomdia!Qualosabor?” Nunca peça sem ter certeza. Se você disser um “queeeeero” mais comprido o ajudante – que é os ouvidos, braços, ânimo e pressa do dono do quiosque – já jogou um pastel de queijo no óleo! Não há tempo para se perder e adivinhação não é o forte em pastelarias.
Você chega decidido e, sem pestanejar, solta um sonoro “O meu é pizza”. Além dos cuidados normais que sua mãe ensina na infância e repete pelo resto da vida, “Corta uma pontinha antes”, “Tem que tomar cuidado com o vapor, uma moça já ficou cega por isso” – aqui vale uma nota: como alguém que escuta isto pode comer um pastel tranquilamente –, “Cuidado que vai pingar na calça”, “Cuidado que vai pingar no tênis”, “Cuidado que vai pingar na blusa”, “Cuidado que vai (e vai mesmo, acredite) pingar!”, existem outros cuidados.
O pastel de pizza tradicional, deixando os regionalismos – ou melhor, considerando minha região como a tradicional (o que está longe de ser verdade) –, é feito de massa, muito óleo, pouco queijo, uma pitadinha de orégano e TOMATE!
O pastel fica dividido em três níveis de calor: o óleo e a massa não têm erro, dois sopros, a temperatura fica a ideal, e assunto encerrado; o queijo é aquele negócio. Escorre, é quente, não parte direito, você tem que inclinar para frente, empurrar o pastel, segura o filetinho de queijo, tenta parti-lo, gruda no guardanapo – se não fosse o aspecto pouco higiênico de todo contexto, você lamberia o papel... é uma briguinha, que no fim das contas chega a ser bacana; sobre o orégano, por questões óbvias, eu não vou falar nada; o problema todo está no tomate. Ele parece reter mais calor que todos os outros ingredientes juntos, dizem que é pela quantidade de água, sei lá. O devorador desavisado, afoito pela fome, atropela-se mordida atrás de mordida, quando chega à fruta – que por muito tempo a civilização achou que era venenosa – é traído pela quentura e quando tenta se desvencilhar a pele – ainda pressa em uma das extremidades da rodela vermelha – traz todo o recheio fervente ao seu queixo. – O amigo da minha prima de segundo grau teve sua cara deformada assim... sério!
Para se comer um pastel de pizza na feira, em primeiro lugar, você deve saber até que ponto consegue controlar seu ímpeto comedor. Se for jogar boca a dentro o pastel todo em uma tacada só, a melhor coisa que você faz é pedir um de carne, frango com requeijão ou até mesmo o simples de queijo. Mas se o pizza é o seu predileto mesmo, aproveite os minutos em que estará dedicado à empreitada para saborear os molhos que a esposa do japonês preparou: uma mordida e um pouquinho de molho de alho; outra e um pouco da pimenta – é de bom alvitre começar sempre pela pimenta mais fraca, tem uns japas sarcásticos por aí –; quando chegar o tomate, que sempre fica do meio para o fim, por que não experimentá-lo com um vinagrete fresquinha? Dê uma sopradinha antes, morda com a convicção de que pele será totalmente partida por seus dentes afiados e boas!

6 comentários:

Anônimo disse...

Muito obrigada pela bela homenagem, Gustavo.
Adorei!
Certamente, mostrarei para o Louis, antes dele encarar sua primeira feira por aí.
Sobre o seu pé (e coração) nas artes, eu bem que gostaria de ter a honra de ser a responsável, mas seria injusto concordar com tal afirmação. Para resumir: é "de família", assim como o exército de formigas que inquietam nossos pensamentos e convicções.
E assim continuamos a vida, a ter idéias, a duvidar delas e a simplesmente existir como todo mundo.
Boa vida a seu blog e vida eterna para suas criações.
Beijos,
Carmen

Anônimo disse...

Fala, Caçula! Agora eu entendi porque a Carmen fica convidando a gente para conhecer o seu blog... hehehe
Não conhecia o seu lado cronista! Muito bacana! Boa sorte por aí! Dê notícias. Beijos

Anônimo disse...

Muito boa a crônica sobre o pastel, e no fundo no fundo é isso ai mesmo!!! =]

Mas a pergunta que não quer calar...Pq os malditos dos meus antepassados deciram um dia quando chegaram aqui no Brasil: Vou vender pastéis!! Ou melhor ainda... Vou abrir uma lavanderia!!!


É... eis a questão.



Bjuuuu!!!

;)

Anônimo disse...

Ei Gus...

Amei a crônica do pastel...apesar de não gostar do de Pizza...rsrsr

Adorei o Blog vou depois gastar muito muito mais tempo nele...certamente valerá a pena !

bjk

Mirca

Anônimo disse...

Gustavo:
Parabéns pelo blog... está ótimo!
A crônica do pastel é a mais pura realidade... Ontem fui a feira e pude constatar.

Bjs,

Camilla
E aí quando vem para Londrina?

Anônimo disse...

Querido amigo Gustavo, adoro seu texto "Pastel". Cada vez que leio, dou muitas risadas. Realmente você é o máximo, escreve muito bem. PARABENS !!! Grande beijo Cris Meinberg